Me sinto um bichinho que escapou da mata e foi parar na estrada, onde nada tem a ver, nada cabe a existência, tudo é nonsense. Sim, é assim que me sinto no lugar que me jogaram pra nascer. As pessoas me assustam e o asfalto confirma meu tédio. O coração de pedra, a alma como um arranha-céu, me sinto pequena, inútil. Aquilo a que suspiro toda hora não me alcança, pois o que vejo é tão concreto a ponto de me furar. Os sentimentos verdadeiros caíram por terra e eu me perdi na cidade grande, de pessoas grandes, mas de corações pequenos. Cheias de títulos, cheias de razão, sem amor. Mas quem me manda querer ser grande e ter coração maior ainda? Talvez isso seja uma espécie de deficiência sentimental. Meu amor não tem crédito, e por isso o guardo na bolsa ensaiando pelo momento de poder entregá-lo. Me disseram que isso não é amor, isso é qualquer coisa lá que não se deve dar a ninguém, pois quem há de merecer? E eu insistentemente acredito em seu poder e o deixo envolto pelo quartzo branco que minha mãe me deu, na tentativa frustrante de conservá-lo. Permaneço a driblar as ciladas que a gente grande me faz cair toda hora, e que eu ingenuamente reajo com dor. Que bobagem! Eu sambo também pois nunca é tão tarde para se passar tempo num mundo-casa. Nem tudo pode assim cruel, moça. Aqui também tem alegria enquanto se aprende a conviver com essa gente, mesmo não sendo igual a ela. Porque as coisas boas e puras ainda existem mesmo que tão invisíveis e poucas entre o rachar do asfalto quente de todo dia. O que falta são os praticantes. Será? Sim, já foi. Prefiro pensar assim, a ter que me afogar numa bebida de um bar qualquer e camuflar minha angústia. Resmungar da vida não faz meu gênero, mesmo sendo bombardeada com o viver dos outros - conviver, nada fácil. O que desejo, nunca terei. Então os sentimentos se reúnem e combinam para serem autossuficientes me invadindo numa ciranda, por muito tempo. A força deles é meu motor.
Mas alguém há de acordar e me surpreender?
Cuidado, isso não é muito de se esperar, pois o mundo ensina a esperteza, mas não traz a sabedoria. O mundo ensina a mentir, mas não a esconde a verdade. O mundo oferece os cargos, mas não te livra de virar pó.
O mundo é bão Sebastião¹, mas não ensina a amar.
¹Música de Nando Reis
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